sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Recifes Artificiais para o Surfe: definitivamente uma necessidade!


Mount Reef, Nova Zelândia.


O interesse em produzir quebra de ondas ideais para a prática do surfe artificialmente tem aumentado em resposta ao aumento do número de surfistas. Segundo estimativas[1], hoje são no mínimo 10.000.000 de surfistas ativos espalhados pelo mundo inteiro juntamente com uma multimilionária indústria de artigos de surfe. Este fato causa o aumento da pressão popular para que a prática do surfe ocorra em mais locais com condições excelentes, provocando deste modo uma forte demanda por qualidade de ondas. O esporte surfe requer uma alta qualidade de quebra de ondas para progredir.

O elevado número de surfistas disputando lado a lado as ondas em um mesmo espaço (crowd) tende a prejudicar o nível de surfe do local, sendo também o principal agente responsável por desavenças entre os surfistas. Segundo estudos realizados sobre este assunto, o crowd traz como conseqüência o incremento da insatisfação para com o esporte. A construção de Recifes Artificiais para o Surfe (RAS) pode resolver este problema e proporcionar outros tipos de recreação em sua área (ex: mergulho turístico e pesca recreativa).

A cidade de Balneário Camboriú (BC), no litoral centro-norte de Santa Catarina, vem ao longo dos tempos produzindo surfistas de alto nível. Um bom exemplo deste fato é o surfista Teco Padaratz, bicampeão mundial de surf (WQS) no ano de 1999. Teco e seu irmão Neco Padaratz (atualmente no WCT) são naturais de Blumenau e aprenderam a surfar nas ondas de BC. Além disto, a cidade possui boas escolas de surfe que proporcionam oportunidade de vida para muitas crianças e adultos. Segundo censo IBGE (2004) a população de BC está estimada em 90.000 pessoas, sendo que nos meses de verão (Dezembro, Janeiro e Fevereiro) esta população aproximadamente triplica em média (270.000 pessoas). Muitos destes turistas, na verdade, são surfistas em potencial que utilizam a praia de BC não somente para o tradicional banho de mar, mas também para aprender surfar. Desta forma, no período de férias de verão, a população de surfistas em BC aumenta seguindo no mínimo as mesmas proporções do censo do IBGE (2004), superlotando a área de surfe na enseada e prejudicando o nível de surfe local. É correto afirmar que o turismo do surfe traz benefícios econômicos à cidade. Mas, é preciso lembrar também que este turismo em BC está muito a quem do que pode render a comunidade do surfe local. Como exemplo, podemos citar o turismo do surfe em Jeffrey´s Bay na África do Sul, que foi responsável por tornar esta praia mundialmente famosa. A cidade lembra um pouco as californianas Santa Cruz e Santa Bárbara que também vivem do surfe. Praticamente tudo gira em torno do surfe. As lojas, os restaurantes, os hotéis e, óbvio, as pessoas. Mesmo quem não gosta de surfar se entusiasma em permanecer horas em algum mirante observando as ondas e os esportistas[2]. Neste caso, foi necessário um planejamento adequado com a participação da população e da associação de surfe local. Somente desta forma o turismo do surfe pode ser devidamente implantado para o benefício da comunidade.

Aproveitando a natureza para o benefício do surfe local

Existem pontos próximos a costa em que já existem quebras de ondas proporcionadas por fundos rochosos. Na grande maioria destes pontos ocorre apenas a quebra pontual da onda, e, portanto, sem condição para “correr a onda” e praticar o surfe. A modificação coerente da morfologia do fundo destes locais pode proporcionar a quebra de ondas perfeitas e extensas para a prática o surfe. No litoral centro-norte de Santa Catarina, existem vários pontos próximos a costa em que uma pequena modificação do fundo pode proporcionar quebras de ondas perfeitas para o surfe. Dentre os pontos com esta característica na região, um se destaca por sua distância da praia (cerca de 1km) e grande área de extensão. O “parcel”, como é conhecido, possui alto potencial para o surfe em BC. O local possui embasamento rochoso (fundo de pedras) que se estende por uma área correspondente a 1 km². Porém, no “parcel” existe apenas uma quebra de onda (esquerda) para a prática do surfe que ocorre somente em eventos extremos com ondulações acima de 2 metros. Para melhor aproveitamento deste local, uma proposta seria produzir artificialmente outras quebras de ondas para o surfe na área do parcel. Estas quebras não aconteceriam apenas em ondulações acima de 2 metros, mas também com ondulação a partir de 0,5 metro. A implantação de RAS nesta área pode aumentar a surfabilidade do local criando novos pontos de surfe na enseada de BC.


Outro ponto a ser salientado é que recifes submersos próximos à costa produzem impacto benéfico na estabilidade costeira. No caso de um possível projeto de alimentação artificial da faixa de areia da praia de BC, os recifes atuariam como uma barreira natural dissipando a energia das ondas e protegendo o alargamento da praia. A construção de um recife artificial submerso associado a um projeto de alimentação artificial da faixa de areia poderia resolver o problema erosivo da praia de BC. Segundo o cientista e empresário do surfe Kerry Black, o realinhamento do trem de ondas no ponto de quebra, bem como a dissipação de sua energia em uma região próxima à costa, resulta na redução do fluxo da corrente ao longo da costa e no incremento da sedimentação a retaguarda dos recifes costeiros[3]. Desta maneira, ocorre o desenvolvimento de uma saliência costeira que, por sua vez, interrompe o processo erosivo no local abrigado pela estrutura (Fig. 1). O crescimento de uma saliência na costa conduz ao aumento da estabilidade da zona costeira[4].

Figura 1: Modelo esquemático dos processos provocados pelo recife artificial. Realinhamento das cristas de ondas e formação de saliência costeira.


A efetivação deste tipo de projeto só ocorre quando estudos de campo e de laboratório são realizados previamente. O entendimento prévio dos processos físicos e geológicos que governam a região de implantação é indispensável para que os objetivos do projeto sejam alcançados. Estas construções costeiras podem ser idealizadas incorporando opções de uso múltiplo como: proteção costeira, habitat para organismos marinhos, local para a prática do surfe em diversos níveis, mergulho, natação segura, pesca comercial e recreacional. Em relação ao surfe em diversos níveis, significa que as estruturas podem ser projetadas para proporcionar qualquer tipo de quebra de onda desejada (tubular, rápida, intermediária e lenta) atendendo, portanto todos os diferentes níveis surfistas.


Existem muitas alternativas sustentáveis e ecologicamente corretas para solucionar problemas costeiros. As tecnologias de recifes artificiais submersos para a quebra de ondas perfeitas para o surfe, bem como para proteção de praias, já estão disponíveis para aplicações estratégicas. Estas estruturas são consideradas o futuro do surfe (aumento de número de locais para a prática com alta qualidade de quebra de ondas) e também da proteção costeira. Antigas metodologias de proteção costeira utilizadas, como muros de contenção, molhes e espigões, não interrompem de forma eficiente o processo de erosão praial. Conseqüentemente, o dinheiro público é muitas vezes utilizado em constantes reparos nas obras costeiras (os reparos custam mais caro do que as obras iniciais). Por outro lado, é marcante o avanço e a utilização destas novas tecnologias no mundo. Países como a Austrália e Nova Zelândia, a muito tempo já utilizam a metodologia de RAS como forma de proteção costeira e também para benefício da comunidade (realização de campeonatos de surfe e etc). Portanto, a capacitação de pessoal e da indústria brasileira se faz necessária para que os recursos costeiros sejam desfrutados por todos e de forma e inteligente.


Locais com potencial para instalação de Recifes Artificiais para o Surfe (RAS) em Balneário Camboriú e região

Todos os locais que serão expostos aqui possuem embasamento rochoso (fundo de pedras). Estas áreas podem se transformar em verdadeiros “point breaks” com qualidade internacional de quebra de ondas para o surfe.

1- Área de Laranjeiras: Local de acesso pela praia de laranjeiras, onde ocorre a quebra de ondas para direita em ondulações de tempestades com direção sul e sudeste. No caso de instalação de um RAS pode proporcionar a quebra de ondas para a direita e esquerda (Fig. 2).

Figura 2: Ponta de Laranjeiras destacando a área de fundo de pedras (área pontilhada) com potencial de instalação de RAS (imagem Google Earth ®).

2- Área do Parcel e Área Praia do Coco: Locais de acesso pela praia de Balneário Camboriú. No Parcel ocorre a quebra de ondas para o surfe quando ondulações de tempestades atingem a costa (somente a esquerda do parcel). No caso de instalação de RAS neste local, toda a área pontilhada pode ser utilizada para quebras de ondas para o surfe (direita e esquerda). Já no canto da Praia do Coco ocorre a quebra de ondas para a direita e para a esquerda em ondulações de leste e nordeste respectivamente. Porém, na quebra para esquerda, duas pedras afloram no meio da parede. Este local pode proporcionar uma quebra de onda para direita com qualidade internacional de surfe (Fig. 3).

Figura 3: Porção norte da enseada de Balneário Camboriú e porção sul da Praia do Coco. Destaque das áreas de fundo de pedras (áreas pontilhadas) com potencial de instalação de RAS (imagem Google Earth ®).

3- Área da Praia dos Amores: Local de acesso pela praia dos amores. Pode ter melhor visualização pelo morro do Careca, rampa de decolagem de asa delta e parapente em Balneário Camboriú. No local ocorrem quebras de ondas em ondulações de tempestades nas direções sul e sudeste. No local mais afastado da ponta do morro do careca, também ocorre uma quebra de onda gorda (com pouca extensão) para a direita. Área com alto potencial de instalação de RAS com quebras de ondas para a direita e para a esquerda em diferentes níveis de surfe (Fig. 4).


Figura 4: Imagem do Morro do Careca e Praia dos amores em Balneário Camboriú. Área pontilhada com alta potencialidade de instalação de RAS (imagem Google Earth ®).

4- Área da Ilha do Atalaia: Local de acesso fácil pelas praias do Atalaia, Jeremias ou Cabeçudas em Itajaí. Também conhecido como “The Box”, o local proporciona uma quebra de onda para a direita em ondulações acima de 2 metros. A quebra para a direita acontece próxima a ilha na área pontilhada (Fig. 5). Porém esta quebra de onda não é extensa e demanda um nível de surfe relativamente alto para o praticante. No caso de instalação de um RAS, esta quebra de onda pode ser aumentada em extensão, bem como para ondulações a partir de 0,5 metro. Ocorre também uma esquerda no local da área pontilhada mais para o meio da praia do Atalaia, porém com pouca condição de surfabilidade. Este local também pode ser melhorado no caso de instalação de um RAS.

Figura 5: Imagem da Praia do Atalaia em Itajaí. Destaque para a área pontilhada com potencialidade de instalação de RAS (imagem Google Earth ®).


[1] Pitt, 1997 apud Mead e Black, 2001.
[2] Acesse: www1.folha.uol.com.br/folha/turismo/noticias.
[3] Retaguarda de recifes costeiros: Área abrigada pelo recife voltada para a costa.
[4] Kerry Black, 2003.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Recifes Artificiais para o Surfe: projeto socioeconômico e ambiental

Narrowneck Reef, Gold Coast - Austrália.


Hoje em dia a idéia dos recifes artificiais pra o surfe está sendo discutida de maneira efetiva entre comerciantes, cientistas, esportistas e até entre políticos. Políticos têm utilizado este assunto como campanha eleitoral no intuito de conseguir o apoio da comunidade ligada ao surfe. Projetos como estes devem ser antes de tudo, idealizados com acompanhamento técnico específico para não colocar em risco a segurança dos surfistas, o ambiente marinho e o equilíbrio dinâmico das praias onde são implantados.
Um estudo realizado em 2002 para a possibilidade de instalação de um recife artificial para o surfe em Newquay Bay na Inglaterra, desenvolveu um questionário com perguntas mais freqüentes realizadas por pessoas interessadas em realizar este projeto. Neste estudo as perguntas mais freqüentes foram:

Quem serão os beneficiados pelo recife?

Os beneficiados serão os surfistas locais, surfistas visitantes e surfistas internacionais. A cidade em geral, os donos de lojas ligados indiretamente e diretamente ao esporte, e a indústria dos hotéis e pousadas, pelo o aumento do turismo consciente e do comércio particularmente na estação de pico. A maioria dos benefícios econômicos ocorre durante as competições de surfe. Outros beneficiários são mergulhadores, body-boarders, pescadores amadores, nadadores e pessoas que vão à praia para se divertir.

Como um recife artificial para o surfe pode realizar boas quebras de ondas para o surfe?

O recife consiste na remodelação do fundo de maneira que permita a onda quebrar perfeita para a prática do surfe. Surfistas necessitam de uma forma de quebra de onda onde a corrida na parte da onda que não quebrou ainda (a parede), esteja a frente da parte da espuma. Quando alinhado adequadamente, o recife artificial irá causar a quebra das ondas em uma velocidade ideal para o surfe. O tipo de quebra da onda, tubular ou manobrável, é também determinado pela forma do fundo. Assim, o recife pode ser usado também para aperfeiçoar o tipo de quebra da onda.

O que acontece se não há ondulação?

Se não há ondulação as ondas não quebram sobre o fundo, assim os melhores beneficiados são os mergulhadores e pescadores.

Poderia o recife fazer com que quebre altas ondas durante todo o verão?

Não, o recife não pode fazer isto, pois a regra número um é: “Sem ondulação no oceano, sem ondas sobre o recife artificial”, e, portanto sem surfe. O surfe depende da natureza.

Quanto tempo pode durar um recife?

Depende do material com que é feito. Por exemplo, se for construído com rochas pode durar eternamente. Por outro lado, manufaturados de geotextil garantem o material por séculos em ambientes abrigados.


Relação custo - benefício

A implantação de um recife artificial para o surfe traz benefícios sociais e econômicos para a cidade, bem como para as cidades adjacentes de onde está localizada a estrutura. Um relatório de impactos socioeconômicos, preparado pelo Comitê de Recifes Artificiais de Opunake em 2002, com a intenção de avaliar a proposta de implantação de dois fundos artificiais para o surfe na Baía de Opunake, Taranaki do Sul, Nova Zelândia, relata os efeitos benéficos que o projeto pode realizar. Para este relatório foram avaliados projetos já implantados ao redor do mundo, bem como aqueles que estão em processo de implantação. Serão apresentados a seguir resultados de 3 projetos avaliados.


  • Projeto Pratte’s Reef

Local do projeto: Cables Beach, Costa Oeste, Austrália.
Objetivo: Projeto realizado unicamente para a melhoria da qualidade do surfe no local.
Data do término da construção: Dezembro de 1999.
Material utilizado para construção: Rochas e granito
Comprimento do segmento maior: 80 metros
Comprimento do segmento menor: 40 metros
Custo total (estudos preliminares + construção): U$1. 500.000

Os benefícios econômicos gerados deste projeto podem ser identificados nos direitos autorais, propagandas e direitos de negócios, patrocinadores de eventos (como campeonatos) e gastos diretos com alimentação, hospedagem e vendas no varejo de roupas e equipamentos. Os impactos econômicos atuais não estão sendo monitorados, mas foram estimados entre U$ 75.000 e U$ 225.000 por ano. Estes valores podem ser gerados através de direitos de negócios. Para direitos autorais o retorno é U$ 300.000 por ano, no mínimo.


  • Projeto Narrowneck Reef

Local do projeto: Gold Coast, Narrowneck Beach, Austrália.
Objetivo: Projeto realizado com 2 objetivos, proteção de praia contra a erosão e quebras de ondas perfeitas para o surfe.
Data do término da construção: Dezembro de 2000
Material utilizado para a construção: 300 sacos de 3 tamanhos diferentes preenchidos com areia.
Comprimento do segmento maior: 400 metros
Comprimento do segmento menor: 200 metros
Custo Total (estudos preliminares + construção): U$2.800.000
Este projeto foi idealizado para gerar 60 vezes mais benefícios (em termos econômicos e de receita bruta) do que os custos, o que representa um alto rendimento. Isto quer dizer que para cada dólar australiano investido, 60 dólares australianos seriam lucrados pelo projeto após a implantação. A título de comparação, um recife de pequeno porte projetado em Bouremouth, na Inglaterra, foi idealizado para gerar 20 vezes mais benefícios do que custos. Para Narrowneck, os benefícios são derivados diretamente da indústria do turismo em receita bruta (U$ 1.600.000 em taxas por ano) e economia de reparos na praia ocasionados pela erosão.


  • Projeto Mount Reef

Local do projeto: Mount Maunganui Beach, Nova Zelândia.
Objetivo: Projeto realizado para a melhoria da surfabilidade no local.
Material utilizado para a construção: Sacos preenchidos com areia.
Comprimento de ambos os segmentos: 50 metros
Custo total até o momento (estudos preliminares + construção): U$ 800.000
Data do término da construção: Projeto ainda em fase de implantação.

Projeto idealizado para gerar 30 vezes mais benefícios do que custos. Neste caso um pequeno recife experimental de 50 metros está sendo implantado. Um estudo de impacto econômico e uma consultoria com relatório de impacto social sugeriram que a implantação pode incrementar a economia local em U$ 500.000 por ano (antes das taxas). Esta estimativa está baseada no aumento de 50 surfistas por dia com ondas favoráveis ao surfe.

Passando a régua

Segundo o estudo realizado pela empresa ASR (Artificial Surf Reef), empresa responsável pela construção do recife que obteve sucesso absoluto na Austrália (Gold Coast, Narrowneck Beach), as estimativas de custo para um recife construído com sacos de areia variam de U$700.000 até U$1.300.000 dependendo de:

O tamanho do recife;
A localização da jazida de areia para o preenchimento dos sacos; e
Se o consentimento do recurso (areia) está notificado ou não.

O preço vai depender principalmente do custo do material e da logística de construção. O estudo sugere ainda que uma relação preliminar de custo e benefício seria de mais de 30 para 1, isto é, para cada dólar investido mais de 30 dólares seriam obtidos de lucro. O estudo da ASR listou alguns dos benefícios gerais do recife:

Aumento da proteção contra a erosão;
Aumento das vendas das lojas ligadas diretamente e indiretamente ao surfe;
Estabelecimento das escolas de surfe;
Local para competições locais, nacionais e internacionais;
Local para enriquecimento da vida marinha;
Aumento do comércio de alimentação e acomodação locais.

Em uma outra região da Nova Zelândia, mais precisamente em Lyall Bay, na cidade de Wellington, a proposta de implantação de um recife para o surfe tem provocado debates sobre a instalação. Até um importante grupo local de avaliadores foi formado, denotando a importância social do projeto. Seus interesses chaves incluem a segurança na água, efeitos na praia, efeitos nas praias vizinhas, impactos ecológicos e tabela de dias surfáveis para a comunidade local. Já em Narrowneck na Gold Coast, foi promovida a relação entre comunidades ligadas ao surfe de diferentes locais na Austrália. Ocorreu uma intercomunicação entre as comunidades no intuito de fornecer esclarecimentos a respeito da construção e funcionamento do recife. Além disto, foram criadas escolas e associações de surfe ligadas ao recife artificial.
Estudos no Recife de Cables Beach, Oeste da Austrália (feito de granito e rochas) indicaram grande colonização de algas marinhas, incluindo largas algas e gramas marinhas, tulipas do mar, tubos de poliquetas (espécie de minhoca do mar) e moluscos. O efeito total ambiental foi considerado positivo pelo aumento da riqueza marinha. O sucesso do recrutamento de diversas espécies de algas e invertebrados é significante. Isto, porque são espécies de base responsáveis pela ocupação básica para a evolução ao clímax de comunidades em recifes de áreas rasas costeiras. A sobrevivência continuada e crescimento das espécies base poderão facilitar o recobrimento da diversidade da vida marinha em áreas que anteriormente não eram habitadas[1].
O interesse em produzir artificialmente quebras de ondas perfeitas para a prática do surfe tem aumentado em resposta a um aumento de praticantes deste esporte. A estimativa hoje é que são no mínimo 10 milhões de surfistas[2] ativos espalhados pelo mundo inteiro juntamente com uma multimilionária indústria de artigos de surfe. O aumento do “crowd” traz como conseqüência o incremento da insatisfação para com o esporte surfe[3]. Este problema fez com que aumentasse a pressão sobre os órgãos políticos na Austrália para que a prática do surfe ocorra em maior número de locais com condições excelentes, provocando também um forte desejo por qualidade na quebra de ondas. O esporte requer uma alta qualidade de onda para progredir. A realização de recifes artificiais para o surfe pode resolver este problema além de proporcionar outros tipos de recreação em suas áreas.
Para que um projeto venha a ser financeiramente e ambientalmente justificado, a surfabilidade precisa ser melhorada sensivelmente se comparada às condições naturais de surfe do mesmo local[4]. O termo surfabilidade significa o número de dias favoráveis à prática do surfe por ano e a qualidade de quebras de ondas para o surfe no local. Para permitir a comparação entre a situação “antes” e “depois” da implantação, é necessária uma avaliação da surfabilidade da área de implantação. A determinação da surfabilidade permite não somente uma quantificação do grau de melhoramento das condições de surfe através da construção da estrutura, mas pode também ajudar na seleção do local ótimo de sua construção.

Portanto, um projeto de um recife artificial para o surfe pode modificar completamente o cotidiano socioeconômico da cidade. Obras como estas trazem desenvolvimento pela alta visitação e, por conseqüência, pela capitalização de empresas ligadas direta e indiretamente ao surfe. A cidade onde estará localizada a estrutura poderá ainda sediar eventos internacionais de surfe devido à alta qualidade da quebra de ondas geradas pelo fundo artificial. Neste caso, a região e a cidade são automaticamente beneficiadas por terem seus nomes divulgados em todo o planeta[5]. Porém, é necessário um projeto bem elaborado, com estudos científicos e sociais preliminares sobre a implantação. Só assim será possível a avaliação dos efeitos gerados pela construção, bem como a maximização dos benefícios oriundos do projeto.

[1] Fonte: Gorham 2000 apud Ranasinghe et al., 2001.
[2] Fonte: Pitt 1997 apud Mead e Black, 2001.
[3] Fonte: Bancroft, 1999.
[4] Fonte: Pattiratchi, 1999.
[5] Os eventos internacionais de surfe são transmitidos ao vivo pela internet (ver: http://www.aspworldtour.com/).



Narrowneck Reef - Gold Coast, Austrália

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Recifes Artificiais para o Surfe: um sonho ou uma necessidade?

Narrowneck Reef, Gold Coast - Austrália.

Criar quebras de ondas perfeitas artificialmente é um sonho que há muito circula nas mentes inquietas de surfistas ao redor do mundo inteiro. No Brasil, este assunto desperta grande atenção devido ao extenso litoral e inúmeros picos de surfe, que são em sua maioria proporcionados por bancos de areia (beach breaks). Hoje em dia, o sonho de criar ondas perfeitas se tornou realidade graças ao estudo de um neo zelandês que tem o surfe como instrumento de trabalho. Seu nome é Kerry Black, surfista e diretor da Artificial Surf Reefs (ASR), Marine Consulting and Research, empresa responsável pela implantação dos primeiros recifes artificiais para o surfe que realmente deram certo no mundo. O Professor Kerry Black é formado em Física pela Universidade de Melborne, Austrália, obteve mestrado pela Universidade do Hawaii e Phd em ciências da terra pela Universidade de Waikato, Nova Zelândia.

Na sua última passagem pelo Brasil, Prof. Black esteve em Itajaí – SC e participou do Congresso Brasileiro de Oceanografia (CBO 2004). No CBO Prof. Black realizou um mini-curso sobre recifes artificiais para o surfe e participou debate com outros professores sobre balanço de sedimentos costeiros (transporte de sedimentos). Além disto, realizou palestra para centenas de estudantes de oceanografia que participavam do congresso, onde divulgou seu trabalho na costa australiana. A ASR (Artificial Surf Reefs) é responsável pela implantação de um recife artificial na praia de Narrowneck, Gold Coast, Austrália, onde além de proporcionar quebra de ondas perfeitas para o surfe, teve como objetivo a proteção costeira contra a erosão. O recife artificial foi construído associado a um projeto de alargamento da faixa de areia. O recife diminuiu a energia das ondas (na área dos banhistas) e acumulou sedimentos na porção onde havia erosão na praia.

Os recifes artificiais para o surfe possuem funções agregadas ao projeto inicial, ou seja, é possível projetar um recife artificial não somente para produzir quebras de ondas perfeitas para o surfe, mas também para proteção costeira, repovoamento de espécies marinhas e local abrigado para esportes aquáticos. Em Narrowneck, o recife foi construído com aproximadamente 300 sacos de 3 tamanhos diferentes : partindo de 20 metros de comprimento e 3 metros de diâmetro a 20 metros de comprimento e 4,6 metros de diâmetro. Os sacos foram preenchidos com areia de mesma característica da praia.

Conversando pessoalmente com o Dr. Black, ocorreu a oportunidade de obter algumas informações sobre a possibilidade real de instalação de um surfing reef no Brasil. Segundo ele, falta o interesse efetivo dos tomadores de decisão para concretizar o projeto e também a participação efetiva da comunidade do surfe, que para Black, possui primordial importância em sua realização. Kerry Black salienta que o Brasil é um dos locais mais propícios do mundo para se obter um recife artificial para o surfe e proteção costeira. Isto devido à alta energia de ondas provenientes de sul e nordeste que chegam a costa brasileira, além dos poucos pointbreaks existentes no país. Black salienta ainda que, a existência de um número maior de pointbreaks (no caso recifes para o surfe) resultaria em mais competidores aptos a ganhar o campeonato mundial (WCT). “O Brasil tem surfistas de nível internacional, mas, poucos locais com qualidade internacional de quebra de ondas para treinar...” aponta Dr. Kerry Black. Países como Nova Zelândia, Austrália, Japão, Inglaterra e Estados Unidos já possuem, ou estão em vias de instalar, projetos de recifes artificiais o surfe. Surfando com Kerry Black em um mar com ondas 0,5 m em Balneário Camboriú (SC), não pude deixar de perguntar da possibilidade de instalação de um recife artificial para o surfe na enseada. Segundo Black, Balneário Camboriú possui todos os requisitos responsáveis para implantação de um projeto vitorioso pois, além de receber ondulações de alta energia de sudeste e leste, possui um sério problema de erosão costeira devido à inexistência de dunas frontais pela construção do calçadão e moradias próximas a linha de costa. Outro ponto levantado por Black é o grande potencial turístico da cidade que praticamente triplica sua população nos meses de verão trazendo muitos investidores, e por conseqüência aumentando arrecadação de impostos pelo governo municipal.

Portanto, para este sonho se tornar realidade em nossa praia, é necessário primeiramente, à união de toda a comunidade do surfe regional, na intenção de pressionar os tomadores de decisão em proporcionar mais oportunidades de vida para a população local. Balneário Camboriú é definitivamente um celeiro de atletas de alto nível, e a implantação de um recife artificial para o surfe (o primeiro no Brasil) faria com que a cidade se projetasse ainda mais a nível nacional e internacional. Deste modo, quem sabe, teremos gerações de campeões mundiais de surfe profissional. Surfe sempre.